quarta-feira, março 22, 2006

A "Coisa"

É público e notório que de médico e de louco, todo mundo tem um pouco.
Pois é, mas tendo eu um pai médico, e como todo filho de médico, sendo eu metido a entender de fisiologia e que tais, supus estar livre dessa profecia.
Ledo engano! Tenho cá minhas idiossincrasias e doidices de estimação. São muitas, e confessas. Só risco fósforo de um lado da caixa, dou boa noite à Fátima Bernardes, mas não ao Bonner, falo sozinho, coleciono canivetes, ando sempre do mesmo lado da calçada, tenho medo de mariposa (mas só daquelas grandonas, raceadas com DC-10), faço barba com navalha e, é loucura, mas fazer o quê?, moro no Hell de Janeiro e gosto.
Mas a loucura que mais me atormenta é a loucura da “coisa” esquecida e não lembrada. É horrível! Acaba com meu dia, e não raro, com a minha semana!
A tal “coisa” esquecida me persegue, desvia minha atenção, sopra no meu ouvido, flerta comigo, me observa de longe, assim, me olhando de ladinho, me chama, e quando eu chego perto, se esconde. Enfim, a “coisa” me tortura. Faz de mim gato e sapato.
A “coisa” esquecida e não lembrada pode ser tudo: uma palavra, um nome, uma data, um conceito histórico, político, filosófico, teológico, econômico, social ou tudo isso com dois ovos em cima, ou, mais freqüentemente, um personagem.

Qual o nome do cavalo do Fantasma?
Qual o nome da espada do Cid Campeador?
Aliás, Dom Rodrigo de quê?
Mestre, Dunga, Atchim, Zangado, Soneca, Dengoso e qual o nome do sétimo anão?
Ira, gula, preguiça, inveja, luxúria, soberba e?
Como chama mesmo a mulher do Abracurcix?
Qual é o feminino de rajá?
Moby Dick, primeiro parágrafo: chamai-me...chamai-me...qual é mesmo o nome?
Por falar nisso, é Acab, ou Aab?

Sentiu o drama? Não, não sentiu foi nada! Geralmente a “coisa” esquecida e não lembrada me assola nas horas mais inconvenientes. No meio de um conselho de classe, ou quando estou na reunião de condomínio, ou às quatro da madrugada em pleno Heavy Duty, ou naquele churrascão zero-oitocentos, ou num almoço em família na casa do meu sogro. Já percebi que a “coisa” esquecida e não lembrada prefere me assombrar em público. E podes crer: quando ela aparece, eu largo tudo, passo a me dedicar exclusivamente a lembrar a “coisa” esquecida e não lembrada. E quanto mais eu penso nela, menos dela ou lembro!
Existe uma solução, mas é um “nome de Deus”, que não deve ser chamado em vão: Eliana! Ela até pode não saber a “coisa”, mas, certamente, será solidária com a minha angústia e será atormentada pela “coisa” tanto quanto eu.
O chato, é que às vezes, ela me usa como “nome de Deus”, e aí, meu camarada...

Ah! Só mais uma coisa: já lembrei de todas essas coisas aí em cima, mas não digo! Você, se quiser que se lasque pra descobrir!

quinta-feira, março 16, 2006

A casa

Mataram a casa do Méier. A casa que era muitas casas e muitas pessoas e muitas coisas.
Já tem muitos anos que evito passar na frente dela. Já não era a mesma, como um parente muito querido na infância, que com o tempo se afasta.
Ela estava envelhecida, o jardim, mais selvagem, descabelado.O quintal, há muito não o via. A pele estava descascando e caindo. Estava decrépita, mas estava viva.
Parece egoísmo, e é. Eu preferia vê-la caindo aos pedaços, morrendo naturalmente de velhice.
Não gostei de ver o terreno baldio, a visão mal tapada por telhas de amianto.
Mataram as festas juninas, apagaram as fogueiras.
Mataram Cosme e Damião, acabaram os doces.
Mataram o Natal , não tem mais rabanadas.
Mataram as minhas brincadeiras, o porão e o quintal.
Mataram o quintal do Moleque, do Sheik, do Kipe e da Marabá.
Acabou o arroz e o suflê de espinafre.
Apagaram a luz do gongá e tiraram a rede do quarto da frente.
Sumiu a etrela da entrada.
Arrancaram a Guiné, o Jasmim e o Manacá.
Secaram o lago.
Onde está a poltrona verde?
Acabaram os licores de leite, de jabuticaba e de vinho.
Não sinto mais o cheiro do defumador.
Morreram outras lembranças, outras pessoas, que se faziam presentes em minha vida através daquela casa. Onde elas estão? Onde vão morar?

quarta-feira, março 15, 2006

Ana Paula.

Abro este blog (nome mais sem jeito!) com seu nome, que é a melhor coisa que me ocorre e esse "ocorre" é lato sensu.
Deveria abri-lo com o meu, em uma formal apresentação de quem sou, onde estou , o que faço e o que gosto, porém, tenho absoluta certeza que isso não interessa a ninguém.
Além do mais, te devo essa. Foi você que me deu força pra voltas a escrever. Espero poder retribuir essa força e todo seu amor, gasto com esse barbudo aqui.