terça-feira, agosto 29, 2006

De como uma bobagem escrita por mim pode vir a ser atribuída a um membro da Academia Brasileira de Letras

Hoje, dia 29 de agosto do ano da graça de 2006, às vinte horas e sete minutos, abri minha caixa de e-mail.

Isso não seria nada demais, se eu não tivesse recebido dois posts do meu blog! Sem nenhum crédito!

Eu sei que quem me enviou, e enviou certamente a um porrão de gente, fez isso por ter gostado do que este que vos fala escreveu. Fiquei feliz mesmo com isso. Qualquer um que se dispõe a dividir sua obra, mesmo que sejam essas bobagens que eu escrevo, se envaidece com o reconhecimento.

O problema é que como os e-mails não diziam de onde eram os textos, e nem quem era o autor, esse reconhecimento à obra que eu obrei e que ainda venho obrando ficou seriamente comprometido. Eu reconheço como minha obra, quem já conhece reconhece também, mas e quem nunca viu? Quem nunca viu, ao ver, não saberá se eu recebi o mesmo e-mail que ele, ou se li em algum lugar, ou se, simplesmente aquilo nasceu sozinho.

Sem contar o perigo de isso ficar circulando eternamente pela Internet, com a autoria atribuída ao Jabor ou ao Veríssimo. Talvez até ao Ubaldo. E mesmo eu não gostando muito do estilo dos dois primeiros, não acho justo que as pessoas atribuam meus pobres textos a eles. Reconheço que eles, pelo menos, sabem escrever.

Por isso eu peço a todos vocês, meus amigos ou não, que se, num momento qualquer tiverem a idéia de enviar meus textos a outrem, dêem o crédito que, se não o autor, os textos merecem. Pode até parecer que escrever essas bobagens é a coisa mais fácil do mundo, mas acreditem, não é. Mais difícil ainda foi a decisão de publicá-los. Minha esposa que me convenceu a abrir um blog, e ela tinha razão, o blog me faz bem. Ou pelo menos fez até hoje.

Quem me enviou meus textos por e-mail eu sei que só o fez por ter gostado e o fez na melhor das intenções, mas certamente enviou a mais gente. Então eu escrevi esta mensagem, honesta e sincera, que encerra o post de hoje, omitindo o nome da pessoa, que aliás, me é muito querida:

Fiquei muito feliz em saber que você gostou tanto do meu blog a ponto de encaminhar uns textos dele. Mas só te peço um favor, ***, põe a fonte. Dá o crédito. Aí é favor mesmo: envia outra mensagem às pessoas, contando que o texto é de minha autoria e dá o endereço do meu blog, tá?Faz isso, por favor?Um beijo do amigo;
Ricardo Palestino.

domingo, agosto 27, 2006

Da série: FICÇÃO PLAUSÍVEL

VI

Veja bem, seu Delegado, eu desfilo na bateria desde que eu era molequinho, Doutor! Meu avô foi o primeiro presidente da escola! Minha avó era presidenta da ala das baianas, mas agora ta na Velha Guarda. Agora vagabundo vem com essa onda? Eles tavam é me tirando de otário! Eu não admito onda com a minha cara! Eu sou sujeito Homem, Doutor, cumpridor dos meus direitos humanos! O Doutor vai concordar comigo.

Foi o seguinte, Doutor: eu tava lá na minha, no pagode da tia Ceição, o coro comendo, feijoada, caipirinha, cerveja, caninha de barril e o diabo. Pois é, eu tou lá com meu cavaquinho, de olho nas meninas, e aí no minuto do comercial eu fui lá atrás no matinho. Quando eu tava voltando é que veio aquele pessoal falar com a minha pessoa. Era três minas e um cara meio esquisitão. Aí eles vieram com um papo de cultura nacional, nossas raízes, resistência, resgate, e não sei que mais. Só sei que eu não entendi porra nenhuma, só entendi que eles queriam que eu fosse tocar numa festa lá deles, e que ia ter cerveja arregada e era zero-oitocentos.

Até aí, por mim, beleza. Voltei lá pra mesa, os caras ficaram me alugando um pouquinho, mas como as minas eram mais ou menos e o cara aparentemente não tava pegando nenhuma das três, aliás, ele nem parecia muito chegado, sabe como é que é, né? Então. Fiquei lá fazendo uma social. Cantei uns sambas caprichando no gogó, bem de olho nas minas mesmo. Vai que uma delas se engraça? Essas minas riquinhas são meio chegadas num negão. Mas acabou que não peguei ninguém mesmo.

Aí eu fui lá, né? Chamei a rapaziada que toca comigo, tudo gente boa: Zezinho Sem Mãe no pandeiro, Tuninho Cagado no tantã, Paulo Gambá no repique de mão, Baiano Bom no reco-reco, agogô e essas porras, que ele não sabe tocar direito, mas é camarada, e Ruésleiston na aba, pra pegar cerveja pra gente. Não, Doutor, não tem apelido não. O cara já se chama Ruésleistson, botar apelido é sacanagem.

Aí, chegamos lá no bagulho. Tinha um porrão de gente, tudo meio esculhambado com cara de quem não toma banho. Mulher que é bom só tinha umas sete. Sinistro é que só tinha carrão no estacionamento. Fiquei até com vergonha do meu chevete. Aí tamos crentes que vamos chegar e começar a tocar, né? Mas tinha que esperar um pessoal lá falar primeiro, aí depois outro falar também, e só depois que todo mundo já tivesse metido a boca no microfone é que podia começar o pagode. Então tá. Mandamos o Ruésleiston ir lá fora e comprar uma garrafa de Pau Pereira pra beber com Fanta Laranja enquanto o pessoal falava lá. Aí nessa hora, depois que eu já tinha enxugado bem uns três copos, um cara lá, aquele esquisitão que foi no pagode me chamar, me chamou pra me apresentar como “um grande sambista, preservador das nossas tradições afros-descendentes” e coisa e tal. Aí tive que ir, né? Nego perguntava uns negócios aí e eu só conseguia responder “É isso aí, daqui a pouco a gente vamos tocar uns sambas pra vocês”.

Aí depois disso começamos a tocar. Quando veio a cerveja, a cerveja tava quente. Achei falta de consideração, mas tudo bem. Tocamos lá uns sambas conhecidos, o povo fingiu que conhecia e coisa e tal, e foi se animando, e bebendo mais cerveja. Nisso um cara lá botou a mão na minha perna e perguntou se eu queria mais cerveja e eu disse que queria e ele voltou com a cerveja e sentou do meu lado. Nessa hora eu tinha resolvido cantar um samba de minha autoria que era assim: “Eu saí na sexta feira, cheio de animação/ falei pra minha patroa que só ia buscar um pão/ mas parei pela birosca para molhar a palavra/ encontrei uma morena que meu cunhado pegava” e por aí vai. Nisso, o cara que tava do meu lado saiu pra pegar mais cerveja, e doutor, eu juro que eu vi, ele passou por outro cara e comprimentou o cara com dois beijinhos, doutor! Eu fiquei bolado, mas fiquei na minha, que eu era convidado e não ia falar nada.

Chegou a hora de intervalo, né? Puxamos o corinho de “Um minuto pro comercial/ Vou tomar uma gelada pra ficar legal” e paramos. Ne que paramos, eles resolveram começar de novo com a falação. E toca o povo a falar um monte de coisa sobre samba, que eu fiquei até meio sem graça, sem saber se eu tava fazendo alguma coisa de errado ou se eles é que não entendiam porra nenhuma de samba mesmo. Nisso, aquele cara que tava do meu lado e parece que era mesmo, e pelo que eu entendi era ele quem mandava ali naquela festa, começou a falar assim: “Eu gostaria de agradecer a presença dos nossos ilustres convidados, que se dispuseram a compartilhar conosco umas poucas gotas do seu vastíssimo oceano cultural popular. Esses são os nossos verdadeiros poetas nacionais, nefelibatas oprimidos pela conjuntura social pequeno-burguesa” e aí ele parou de falar por causa de que o Toninho Cagado, muito puto dentro das calças saiu gritando: “NEFELIBATA É A PUTA QUE TE PARIU!!!!!!” e já levantou metendo a mão na palhaça do menino. Aí, eu pra separar enfiei meu cavaquinho nos córnos de um loirinho que estava indo pra perto do Zezinho Sem Mãe gritando “faz ele parar, faz ele parar” que eu achei que ele ia se engraçar com o Zezinho e o Zezinho não gosta de dar confiança. O Baiano Bom, que tava enfiando o agogô na orelha de um sujeito lá também foi pra cima do loirinho e deu-lhe um rabo de arraia tão bem dado, que até Mestre Pastinha ia ter que admitir que na capoeira ele era o cara. Nessa mesma hora o Paulo Gambá tava dando umas bolachas num cabeludinho lá que tinha dito que éramos todos irmãos, e o Paulo não gostou, que na família dele nunca que teve uma bichona. O Ruésleiston, que não é bobo nem nada já tinha abastecido o chevete com umas caixas de cerveja, além de colocar quatro minas lá dentro e ligado o motor. Depois ele me explicou que só deu pra levar quatro minas que as outras três duas eram sapatão e a outra tava doidona de maconha e não tava entendendo mais porra nenhuma. Aí partimos com as minas pra comunidade e terminamos o pagode lá mesmo, no quiosque do Jorginho Jumento.

Isso foi na sexta feira, seu Delegado, e eu tou aqui hoje pra prestar queixa de assédio sexual contra aquele cara que botou a mão na minha perna, e também por causa de que como o loirinho usava óculos, ele quebrou meu cavaquinho e agora eu tou só com o banjo pra tocar.

terça-feira, agosto 22, 2006

Da série: FICÇÃO PLAUSÍVEL

V

Carlos Marcelo trabalhava numa xerox. Um dia, bateu esse memorando aí pra ele copiar:

Ao Sr Exm Diretor Presidente do Centro Recreativo Presidente Costa e Silva:

Venho por meio desta comunicar-lhe do lamentável incidente ocorrido no último sábado passado, no quando de um desenrolar da peleja futebolística entre dois times universitários, um e História, o outro de Veterinária, parte da nossa quadra foi acidentalmente envolvida em uma rusga entre os contendores. A parte da quadra que foi envolvida no conflito foram as traves, as redes, a mesa de ping-pong, os tacos de sinuca, o placar e a arquibancada. O piso da quadra, apesar de meio sujo e manchado, não sofreu maiores danos. A arquibancada caiu, já que mexeram naquela lata de goiabada que a gente usava lá pra escorar.

Depois que a polícia se retirou, ao efetuar a faxina do lugar encontramos:

#Setenta e nove dentes sortidos, entre incisivos e molares, além de um root e quatro pivôs;
#Vinte e oito canetas, vermelhas e azuis, mas só quatro funcionavam;
#Trinta e sete garrafas vazias de conhaque Dubar e mais a mesma quantidade de garrafas de vinho quinado da mesma marca, sendo que numa ainda deve ter bem uns dois copos;
#Uma garrafa de cachaça, marca “Vai que é Tua”, ainda com a chapinha;
#Quinze porretes de madeira, oito vergalhões e três canos de PVC;

#Um legítimo canivete Corneta;
#Vários pedaços de correntes, somando ao total de um metro e vinte e dois;
#uma edição de bolso do Armorial Português;
#Um pára-lama azul de fusca, bastante danificado;
#Um pneu de caminhão;
#Três galinhas d’angola;
#Uma lata de goiabada vazia (aquela que escorava a arquibancada);
#Quatro calcinhas e dois sutiãs;
#Trinta e dois discos de forró e um do Led Zeppelin;
#Uma camisa da Refrigeração Cascadura;
#Papel pra caralho;
#Um gambá, perto da “Vai que é tua”;
#Um urubu pintado de verde;
#Um prestobarba novinho;
#Um prato de farofa de dendê com duas velas vermelhas;
#Um saquinho de orégano;

#Oitenta e dois quilos de latas de cerveja vazias.


Sugiro vendermos as latas, as garrafas e o pára-lama de fusca para cobrir o prejuízo, e o resto doar para o criança esperança, com exceção do gambá, que fugiu com a garrafa de “Vai que é Tua" e das galinhas d’angola, que já estão devidamente temperadas com orégano, sabendo que posso contar com a sua presença no jantar de hoje...

Sem mais, creia-me seu patrício e admirador;

Ronildison Silva.

Depois de lido e copiado,Carlos Marcelo só pensava nas calcinhas...

Difícil é o Nome

Tem uma rapaziada aí me perguntando que raio de nome de blog é esse. Vou explicar:

Nos idos da década de noventa, eu era mais um estudante de História em uma famosa universidade, numa terra de índio, onde Nietzsche é herói, joelho é italiano e pastel é sorriso. Até hoje não me acostumei com essas idiossincrasias da província.

Pois bem. Como sói acontecer em faculdades onde todo mundo é meio intelectual e meio de esquerda, existiam diversas facções de desocupados, todas se achando muito intelectuais e muito de esquerda, e achando os outros muito alienados e de direita. Isso, como você pode imaginar, e se não pode eu conto, gerava enormes e intermináveis discussões sobre como mudar o mundo, sobre o sexo dos anjos, sobre quem nasceu primeiro o ovo ou a galinha, e outros assuntos da mesma relevância.

No meio dessa falta do que fazer generalizada, uma facção se destacava: os PISCs, sigla de Pessoas Sensíveis Inteligentes e Criativas, um pessoal nostálgico, sabe qual é? Daqueles que no fundo no fundo, queriam viver numa ditadura só pra tomar porrada da polícia , tirar onda de exilado político e de artista genial incompreendido. E esse povo tinha cada idéia, que puta que pariu, dava pra adubar o deserto do Saara, e ainda fertilizava Gobi, Atacama, Mojave e o semi-árido nordestino.

Pra você ver, vou contar só uma: certa feita, notando que o prédio da faculdade tinha sete conjuntos de colunas (pilotis), esse povo houve por bem arrecadar dinheiro, com banquinha e tudo, pra pintar cada uma das colunas com uma cor do arco-íris. A justificativa deles era humanizar o concreto. Pra mim, e pra grande maioria das pessoas que não precisa de gardenal diariamente, era pura babaquice, ou viadagem, ou muito tetra-hidro-canabinol nas idéias, ou tudo isso com dois ovos em cima. Não pintaram, mas também não devolveram dinheiro de nenhum contribuinte.

Mais ou menos por essa época, esses PSICs lançaram um jornaleco xerocado, cheio de literatice, onde, imediatamente, duas coisas me chamaram atenção. A primeira foi um texto panfletário, cheio de indignação esquerdista libertária comunista pra caralho contra o homem branco português colonizador feio bobo e cara-de-mamão. Até aí, era de se esperar. Mas o chute nos ovos veio com a seguinte passagem, abre aspas: No dia VINTE E UM DE ABRIL, o português pisou nesta nossa terra, fecha aspas.

PUTA QUE PARIU! Alunos de História! Tudo bem que esse negócio de ficar lembrando datas é chato, que historiador não é calendário e tal, mas, porra, o filho das unhas que escreveu isso não teve nem o trabalho de descobrir que o Brasil foi descoberto oficialmente em VINTE E DOIS de abril! Vinte e um é Tiradentes, porra, não lembra que é feriado?!

Mas o que veio depois foi é que foi de arrancar os cabelos do saco. Um sujeito expeliu um poemelho, daqueles que você nota que o cara fez um puta esforço pra parecer que não fez esforço nenhum, que iniciava com a seguinte pérola, abre aspas: O que eu mais gosto em uma mulher são OS SEUS CLITÓRIS, fecha aspas. OPA! Os seus? Foi nesse ponte que eu pensei que fosse um erro de digitação, já que, por princípio, acredito na boa vontade. Mas não era. O desinformado menestrel passou o poema todo se referindo aos clitóris das mulheres. Eu juro que na hora eu fiquei com pena.Esse cara nunca deve ter visto um mulher pelada. Nem em revista sueca, que é o melhor Atlas de anatomia do mundo! Ou então, eu que não descobri os outros....

Conste nos autos que a tal publicação PSIC atendia pelo singelo e poético nome de “BORBOLETA NEGRA”.

Passada a pena, eu e um amigo, meu caro camarada Luck Luciano, o facínora da Amaral Peixoto, resolvemos sacanear, já que nosso lance era muito mais implicância do que política. Resolvemos, nós mesmos publicar outro jornal xerocado, onde a proposta editorial era sacanear a tudo e a todos , sem pena ou remorso.

Como já sabe uma famosa escola de samba aqui do Rio, difícil é o nome. Tentamos vários, e nenhum servia a nossos propósitos. Ou eram sérios demais, ou sérios de menos. Um dia, não sei quando nem onde, ouvimos uma música do ainda Jorge Ben, que tem um verso que diz, abre aspas de novo: ô mangangava da barriga amarela..., e outro que diz: toma cuidado com mangangá.

Achamos o nome! Sem sair da insetologia geral e comparada, achamos no dicionário: mangangava: s.m. Bras. Nome das abelhas sociais do gênero Bombus, de ferroada muito dolorida,responsável pela polinização de várias plantas, entre elas o maracujá. Durante esse processo, apresenta uma faixa abdominal, que tende a ficar amarelada pelo pólem. Também chamadas de mangangá ou mangangaba./ Brás. (NE) espécie de besouro grande que rói a madeira. Perfeito! Caiu como uma luva!

O nosso Mangangavamarela, juntinho assim mesmo, que a diagramação era muito ruim e precisava de espaço (eu era o diagramador) teve uma aceitação tão grande, que rapidamente surgiram outros, como o povo lá chamava, “documentos” do mesmo tipo, e número de cartas abertas pipocou naquele lugar! Todo mundo queria ser engraçadinho (nós também, mas, pô, olha o respeito, fomos pioneiros). Me lembro especificamente de dois: “Os Tibetanos contra China e o povo Mongol" (tinha um PSIC cujo apelido era China) e o "D.A. pra mim".

O Mangangavamarela durou alguns números, com uma tiragem oficial de R$ 5,00, ou seja: se a xerox aumentava, diminuía a tiragem. Não raro um ou outro vagabundo coçava o bolso e nos dava uma grana pra tirar mais xerox. Só pra não passar em branco, o Borboleta negra só teve mesmo aquela edição”.

Foi muito bacana, o pessoal gostava à beça. Mas o chato é que eu até hoje ao tenho nenhum exemplar do Mangangavamarela comigo. O Luck diz que também não tem, mas eu acho que ele está escondendo um monte, com medo que eu roube dele....

sábado, agosto 19, 2006

Da série: FICÇÃO PALUSÍVEL

IV

Mas porrada mesmo, de verdade, teve naquele jogo de futebol, entre o time da Faculdade de Veterinária e aquele povinho sem caráter do curso de história, aquela cambada de comunistas safados e sem vergonha. Saiu um cacete firme! Apanhou até quem nunca tinha apanhado na vida!

Aqueles comunistas começaram a criar caso depois que uma jogada ofensiva do timinho lá deles, que foi brilhantemente neutralizada pela genial zaga da Veterinária. Aí que começou a confusão! Só por causa de que o Almeidinha, aquele que é da igreja, crente, né?, e três vezes vice-campeão estadual de luta livre, cortou o ataque com um armilóque voador (o terceiro do jogo! Vejam só: não é todo dia que um zagueiro se destaca assim!), um gordinho lá do outro time se sentiu no direito de tomar satisfação e pedir que o juiz marcasse um pênalti a favor da História! Sendo que o juiz já tinha até acertado um negócio aí, de papo de uns duzentos merréis com o C.A. de Veterinária. Veja só, esse povo de esquerda fala muito , mas queria subverter a sua palavra dada dele, dele o juiz, entendeu? A essa altura, a torcida lá deles já estava perdendo o controle, possivelmente devido a enorme quantidade de conhaque com vinho quinado que estavam consumindo. Aliás, os jogadores também tamparam firme nisso aí antes do jogo. Deve ser dópingue. E no meio daquela discussão de que se foi pênalti ou não foi pênalti, o Rodriguinho, capitão do time de Veterinária, que aliás, já tinha até se formado e trabalhava numa fazenda de inseminação artificial de vacas em Goiás, mas que veio especialmente dar uma força por colegas, você vê o que é um cara de bom coração, se despenca lá do cu do mundo só pra ajudar os amigos. Enche meu copo aí! Então? O que eu tava falando? Ah sim, o Rodriguinho! O Rodriguinho veio e falou o seguinte: Vá tomar no cu vocês tudo! Que vocês da História é uma cambada de maconheiro safado, comunista, caloteiro, cachaceiro sem caráter, fedorentos e ainda por cima é tudo boiola!

Nisso, um parrudo lá da torcida deles veio gritando lá da arquibancada “BOIOLA NÃO!!! VIADO É A PUTA QUE TE DEU LEITINHO!!!” E desceu o maior tapa na orelha do mundo no pobre do Rodriguinho, que, gente, eu juro, ele ficou quinze dias murmurando que o número chamado está fora da área de cobertura ou desligado por favor tente mais tarde. E foi aí que a merda virou boné! Eu não posso falar muito não, que já no começo da briga alguém me acertou com um pára-lama de fusca, que eu só me lembro que o pára-lama era azul calcinha. Mas o Gustavo, que só perdeu três dentes da frente e foi desmaiar só quinze minutos antes da polícia chegar, me falou que foi um negócio horrível, feio mesmo de se ver. Por isso que eu digo: esse negócio de estudar história deixa as pessoas meio revolucionárias. Uquê? Quem ganhou? Na porrada foram eles, mas o jogo foi zero a zero...

sábado, agosto 05, 2006

Da série: FICÇÃO PLAUSÍVEL

III

Acordou de olho roxo, no colo da maior ressaca do mundo, na rodoviária de Itaguaí.

Sem condições de lembrar nem o nome da mãe, ligou pra Bruninha, do recursos humanos.

“Menino! Eu pensei que tinham te matado depois do Parabéns pra você!”

Antes não tivesse ligado! Ficou sabendo de todas as feiúras que fez no aniversário da Dona Cleide. Misturou cerveja quente em copo de plástico com vinho de garrafão, matou a batida de amendoim, empinou uma garrafa de Continni no gargalo, comeu um pote de creme hidratante, bebeu um vidro de xampu com o devido condicionador, vomitou na pia da cozinha e detonou meia garrafa de Natu Nobilis (Natão é foda!).

Dançou forró com um cabide, fez “chão, chão, chão” em cima da mesa da varanda, cantou “Chora bananeira/ Bananeira chora”, puxou um pagode-putaria com a gravata na testa e batucando com uma caneta numa garrafa de cerveja, peidou na frente da Michele, aquela gracinha da recepção, passou a mão na bunda do Carlinhos da contabilidade e por falar em bunda, fez um discurso em louvor da dita cuja da Dona Celinha, onde, com graça e donaire, encerrou com chave de ouro: “um rabo aquele tamanho não tem dois gomos, tem hemisférios”.

Começou a apanhar depois do “parabéns”, quando, já quebrando o abajur, puxou o corinho da “chuva cai; a rua inunda”.

Pensou em comer um pote de racumim. Mas tomou um café e foi pra casa.

quinta-feira, agosto 03, 2006

Da série: FICÇÃO PLAUSÍVEL

II

Fez o curso pelo correio. Em seis meses era pastor. Gastou oitenta pratas num terno azul claro, engraxou o sapato, ensebou o cabelo meteu o desodorante e a bíblia no suvaco e partiu para salvar as almas das garras do Diabo.

No trem, apesar dos seus erros de concordância e dos epítetos carinhosos que os passageiros lhe dirigiam, conseguiu cantar dois Hinos, recitar três salmos e meio, além de expelir um lindo discurso de 50 minutos, onde com redundância e prolixismo, disse nada com coisa nenhuma, acreditando em cada vírgula que saia de sua voz.

Passou o dia na Central do Brasil, repetindo o discurso do trem, com pequenas variações sobre o mesmo tema, só parando para comer um joelho com suco de caju ali do lado. Foi embora satisfeito.

Na volta, para não cair na ociosidade, aproveitou o público do trem e veio esculhambando o Diabo, chamando ele de tudo que é nome que não fosse palavrão. Mal tinha entrado em seu barraco, ali em Vila Aliança, não viu o Caveirão gritando com aquela voz de manilha: “EU VIM BUSCAR A SUA ALMA!!!!”

Voltou correndo pra Moita Bonita, Sergipe, onde planta milho, feijão e macaxeira e nunca mais buliu com essas coisas de religião.

Da série: FICÇÃO PLAUSÍVEL


I
Acordou de ressaca, do lado de uma senhora do tamanho do 696 (Méier Dendê) num motel em São Cristóvão. Desceu da cama, se vestiu, vasculhou todos os bolsos que viu pela frente ou pelo chão, contabilizando trinta e sete reais e umas moedas, meio maço de Derby suave, um cartão do Rio-Card, um vale-refeição de seis e noventa, dois chicletes, um isqueiro vagabundo como o logo da Skol, um pacote aberto de Hall’s preto e um panfleto com o Salmo 23.

Acendeu um derby, largou o maço, botou um Hall's na boca, catou os fósforos, o pente, as miniaturas e uma latinha de Antártica no frigobar. Saiu de fininho, pra não acordar a jubarte, falou qualquer merda pra mocinha da recepção e saiu. Na rua, abriu a latinha, deu um gole, cuspiu o Hall's, deu outro gole e foi andando para o Largo da Cancela.

Na São Luiz Gonzaga, entrou numa padaria, pediu um maço de Hollywood, um café com leite, uma bananada e um pão com polenguinho.

Tomou uma Itaipava, meio quente, pagou a despesa e caiu debaixo do 312 (Olaria, Praça Mauá, circular) .

Ao dar entrada no Salgado Filho, ainda tinha forças para falar de si para consigo:

“Pelo menos, aqui eu sei como eu vim parar!”