quarta-feira, junho 27, 2007

Da série: FICÇÃO PLAUSÍVEL

XIV

O senhor também é professor? Putz...

Eu até que gostava de dar aula no começo, mas depois, o tempo vai passando, a gente vai vendo como é que as coisas são de verdade. Não ri não, que é só uma questão de tempo pro senhor me dar razão.

É o que eu digo sempre: não adianta nada você se matar pra fazer aula, estudar, bolar trabalho bacana, essas porras todas que os pedagogos dizem que você tem que fazer. Esses moleques não querem saber é de porra nenhuma. É só bagunça, tou mentindo?

Eu mesmo já acreditei que adiantava alguma coisa. Tentei filme, quadrinhos, música, textos de tudo que é escritor, teatro, passeios e o escambau. Adiantou o quê? Só arrumei trabalho, amigo, só dor de cabeça! Mais trabalho pra corrigir em casa! E isso sem contar a aporrinhação em sala. E eu nem vou falar dos passeios, que o colega sabe como é que é, né não? É um tal de moleque correndo, gritando, fazendo merda...E quando some um, o sanhaço que não é?

É verdade, o senhor tem até um pouco de razão nisso aí. Sempre tem uma meia dúzia que salva. Mas é raro viu? A maioria só quer saber mesmo é de brincadeira. Tá, tudo bem, é verdade. Mas nem sempre, o senhor há de convir. A maioria só faz pergunta idiota mesmo. De mais a mais, a gente sabe que a maioria das coisas que a gente ensina eles, quando aprendem, vão esquecer, ou não vão usar pra nada mesmo! Vê se tem cabimento ensinar pra um filhinho de papai o que é luta de classes! Vai entrar por um ouvido e sair pelo outro! Eu é não acredito mais nessa de mudar o mundo não! Vou ficar lá falando pras paredes? Os caras só querem é sair dali e ganhar dinheiro! Que faculdade que o quê? Eles só fazem faculdade se o papai paga! E mesmo assim de má vontade, meu amigo! Não é que nem a gente que ralou às pampas pra se formar. Hoje em dia, em qualquer quitanda o cara entra e sai advogado! É assim sim, eu sei o que eu tou falando, amigo! Você fala isso porque é novo ainda. Quando tiver o mesmo tempo de magistério que você vai ver só se eu não tou certo! Foram oito anos, amigo! Oito anos aturando aquelas pestes! Os cinco últimos em escola pública! Pedi exoneração e não me arrependo! A melhor coisa que eu fiz na vida foi largar de ser professor e comprar esse táxi!

É aqui mesmo? Tem trocado não, amigo? Então deixa por dez merréis mesmo. Eu me lembro como é que é o salário. Boa sorte amigo, fica você com Ele!

sexta-feira, junho 15, 2007

LOVISTÓRI

Estava encostado a um poste, em frente ao prédio em que ela trabalhava. Fumava o sétimo cigarro da hora, já partindo pro oitavo. Ela trabalha no oitavo andar...

Ele já nem lembrava o motivo da briga, mas a briga foi feia. Feia, doída, rancorosa e triste. Choro e ranger de dentes. Disseram coisas um ao outro que pensavaM não querer dizer. Ela pegou pesado. Ele não deixou por menos. Lágrimas e mágoa pra todo o lado. Ela saiu batendo a porta e os saltos pelo corredor, e ele não sabia o que mais doía: o soco que ele deu na parede ou a impressão que ela não ia voltar. Na dúvida, se nocauteou com uma garrafa e meia de conhaque.

Esperava por ela, e enquanto esperava, escrevia mentalmente a homilia de reconciliação. Com a cabeça coberta de cinzas assumiria a autoria dos erros. Mea máxima culpa. Estava disposto a aceitar qualquer penitência. Ela ia voltar.

Ela saiu e deu de cara com ele. Ele viu que ela o viu. Ele sorriu, meio sem graça. Ela virou as costas e entrou num táxi. Ele foi pra casa, acabar com aquele restinho de conhaque.

Nunca mais se viram e foram felizes para sempre.